Este é um blog literário; minha matéria-prima são as letras. Tento, sempre que possível, utilizar a norma padrão (outrora chamada “norma culta”) do português em meus textos.
Mas não é que seria errado desseguir a norma padrão. Em alguns textos, principalmente nas ficções, nós rompemos algumas regras, em nome da arte: inventamos palavras, utilizamos o discurso indireto livre, evitamos as mesóclises etc. Isso torna o texto mais bonito e mais agradável: “amarei ela para sempre” no lugar de “amá-la-ei para sempre”. Também pode deixar as narrativas mais interessantes, como no caso dos neologismos: palavras criadas, como “desseguir”, enriquecem o discurso, e transformam o ato de escrever, de mera informática, em invencionática, como diria Manoel de Barros.
Mas, se fugir do padrão faz a redação ficar mais bonita e agradável e interessante e rica, qual o sentido de seguir a norma padrão? Por que ela existe?
Ela existe, bem, para padronizar a língua.
Para que duas pessoas não leiam a mesma frase e entendam duas coisas opostas, a norma padrão tenta “minimizar ao máximo” a ambiguidade do discurso. Isso é deveras importante, por exemplo, em um contrato ou numa prova de concurso ou faculdade. Quem já realizou uma prova mal escrita sabe que erros “bobos”, como o uso incorreto de pontuação e conectivos, perturba gravemente a compreensão do texto.
Na maioria das vezes, fugir à norma apenas faz com que o seu leitor repare que houve um “erro de português”. Na minoria dos casos, o “erro” prejudica o entendimento da escrita.
Por exemplo:
Este projeto vai de encontro às expectativas.
Este projeto vai ao encontro das expectativas.
Ou:
Você vai ao carro.
Você vai no carro.
Duas frases parecidas, com significados bem diferentes.
Mesmo que o desvio da norma padrão não atrapalhe a assimilação do sentido do texto, se as discordâncias forem de mais, a estética da redação fica importantemente prejudicada. Não é porque o leitor é chato; é porque o excesso de “erros” realmente torna a leitura mais aporrinhante. Incorre em falha congênere o sujeito que se excede no uso dos rebuscamentos da última flor do Lácio na feitura de suas sentenças; exempli gratia, a própria proposição predecessora a esta.
Alguns erros ainda sugerem a incompreensão de elementos fundamentais da língua por parte do escritor. Por exemplo, o uso de crase antes de substantivos masculinos ou verbos, como em “à caminho” ou “à seguir”, indica que o autor não entende realmente o que a crase quer dizer. Seria como, por exemplo, usar uma palavra da qual não se conhece o significado.
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O português transcende à norma padrão e isso não quer dizer que ele é errado. Às vezes, o “certo” é usar a linguagem coloquial. Como disse Vinicius de Moraes, depois de ser criticado por um “erro” de uniformidade de tratamento na letra da belíssima canção “Se todos fossem iguais a você”:
Ninguém, a não ser uma múmia da Academia Brasileira de Letras, dirá à namorada: “Minha querida, eu a amo”. […] O que se fala no Brasil é “Minha querida, eu te amo”.
Porém, quando fazemos trabalhos acadêmicos, montamos o site de uma empresa ou escrevemos uma carta formal, precisamos usar a língua padrão. A pena, caso não a utilizemos, pode ser a interpretação errônea do que queríamos dizer.

agradeço a referência no seu “sobre” 🙂 e recomendo:
https://papodehomem.com.br/search?utf8=%E2%9C%93&search=prisao+preconsseito
(o link agora está fora do ar, não sei porque, mas já deve voltar.)
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