Foi esses tempos atrás, aos meus 24 anos, que entendi a diferença entre emoção e sentimento e percebi que tratá-las como sinônimos é uma forma um tanto equivocada de lidar com elas.
Assim, aprendi que emoções nada mais são do que reações instintivas do corpo aos estímulos externos e que os sentimentos expressam como nos sentimos perante essas emoções e que costumam ser duradouros. Digamos, então, que as emoções têm mais a ver com o exterior, enquanto que os sentimentos têm a ver com o (nosso) interior.
Para que ficasse mais claro de entender na minha cabeça, decorei o seguinte exemplo: o fato de um bebê chorar, trata-se de uma emoção mediante a qual pretende buscar alguma resposta à sua necessidade naquele momento, seja frio, fome, raiva ou tristeza.
Por que estou falando isso? Porque percebi o quão difícil é expressar essas emoções “difíceis” com palavras pois, simplesmente, não existem palavras suficientes.
Mas como assim não há palavras suficientes ou exatas para isso se existem milhares e milhares de palavras que eu não conheço? Somos tão vastos por dentro ao ponto de sentir tanto que as palavras que conhecemos resultam ser insuficientes?
O processo de calibrar e expressar as emoções “não-puras” é tão complicado que existem palavras que não possuem tradução de um idioma ao outro, isto é, não há forma de levar seu significado de uma língua a outra, justamente porque elas têm uma marca particular de complexidade ou encontram-se associadas a um determinado contexto social. Por exemplo, quando adotei a Savana (uma das minhas gatas) não conseguia olhar pra ela sem sentir uma vontade muito mas muito grande de apertá-la extremamente forte. Pois bem, isso tem um nome e chama-se “Gigil”. Gigil é um termo derivado do filipino que significa querer “apertar” alguma coisa devido à ternura que nos provoca. Legal,né?
Bom, um certo dia, você resolve baixar o Tinder, conhece aquela pessoa bacana, trocam números de telefone, começam a conversar e sem perceber você pensa “que preguiça, até eu conhecer todos os pormenores desta pessoa vai levar um bom tempo”. Quem nunca, certo? Essa frustração que nos gera o tempo que é necessário investir até chegar a conhecer alguem, tem um nome e é “adronitis”. Acredita-se que esse termo provém do romano, pois um “adronitis” era uma característica da arquitetura romana antiga, algo assim como um corredor que conectava a parte da frente da casa com o átrio interior.
Como pôde-se perceber, nosso dia a dia está repleto de emoções e sentimentos comuns que não recebem nenhum nome e, foi precisamente a alguns desses órfãos de denominações que o editor e realizador audiovisual estadunidense John Joenig prestou especial atenção e que, desde 2009, tenta batizá-los no seu curioso projeto web The dictionary of obscure sorrows.
Para dar nome a esses sentimentos, não se valeu apenas da descrição escrita, mas também de vídeos nos quais insere imagens com um teor nostálgico que incitam à reflexão, enquanto narra situações que ajudam a exemplificar o conceito. Foi assim, então, que conseguiu criar mais de cem neologismos com significado etimológico e que foram construídos a partir de uma dúzia de idiomas.
Bem, como eu dizia, apesar do esforço de John, na maioria das vezes, faz-se difícil encontrar formas de identificar, traduzir e expressar emoções difíceis. Não conhecemos a palavra que consiga precisá-las e isso nos causa uma inquietação, visto que a possibilidade de conceituar alguma coisa é o que nos permite, também, abordá-la.
Basicamente costumamos classificar nossas emoções em cinco grupos fundamentais: alegria, tristeza, raiva, medo e nojo. Acontece que, às vezes, de fato, aquilo que sentimos, corresponde a alguma dessas emoções básicas. Não obstante, acontece também que essas emoções são muito genéricas para permitir-nos sermos precisos. Nosso medo é nojento ou nossa raiva, medrosa.
Assim como nos mostra o filme Divertidamente, da Disney, o que configura as emoções difíceis reside no fato de que mesclam-se outras emoções, aparentemente muito distintas entre si. Portanto, para compreender que não existe uma maneira categórica de nomeá-las, isto é, não temos como colocar as nossas emoções em caixinhas com um nome cada uma, é necessário uma flexibilização do nosso pensamento e despojarmos da tentação (acredito que automática) de catalogar essas nossas emoções desde uma perspectiva ética: não existem emoções más e nem boas. Na verdade, potencialmente, no que diz respeito às suas consequências, uma emoção pode ser muito boa ou muito má. Apenas.
Dito de outra forma, as nossas emoções podem chegar a ser um antecedente para nossos atos, mas nunca deveriam justificá-los.
Ademais, é importante abandonar a ideia de reconciliar o irreconciliável. A alegria triste é alegria triste e não há nenhuma lei ou dogma que nos diga que uma das duas tenha que dominar sobre a outra.
Tudo isto foi para falar o tanto que me acho, como ser humana, limitada quanto a palavras para expressar todos os meus sentimentos e como isso resulta ser frustrante, pois a expressão libera, assim como a impossibilidade de falar comprime (e inclusive, estressa).
John, o nosso amigo construtor-de-neologismos, criou uma palavra para conceituar a tendência a deixar de falar acerca de uma experiência porque as outras pessoas são incapazes de entendê-la: exulansis (do latim exulans, que significa “vagabundo”). E talvez, seja esta a sensação que temos quando procuramos uma palavra para expressar o que sentimos e não a achamos e, por isso, deixamos de explicar aquilo que estamos sentindo.
Só não entendi o porquê do “vagabundo”.

Bom demais, Raíza. Mandou bem!
Ninguém é responsável pelo que sente, mas é responsável pelo que faz. Como dizem, o que nos define não é o que acontece a nós, mas como reagimos ao que acontece a nós. Eu gosto de resumir esse pensamento com a simpática frase: cabe a cada um segurar a própria onda.
Essa coisa de categorizar emoções me lembra um pouco o que Nassim Taleb chama de platonicidade: queremos colocar o mundo real em caixas que nos permitem entendê-lo. Na verdade, precisamos disso! O mundo é complexo demais para que possamos compreendê-lo em cada exceção, em cada nuance. Assim, juntamos coisas mais ou menos parecidas e colocamo-lhes os mesmos rótulos, apenas para mais cedo ou mais tarde saber que aquele rótulo resulta impróprio, dependendo da situação.
Parabéns pelo texto e obrigado pela contribuição.
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