Cigarros eletrônicos (vapes, pods, dispositivos eletrônicos para fumar) são dispositivos que usam uma bateria para esquentar um líquido, gerando um aerossol que é inalado pelo usuário. Existem cigarros eletrônicos em várias formas e tamanhos, mas em geral eles cabem no bolso e têm mais ou menos o mesmo volume de um maço de cigarros comuns. O líquido (essência, salt, juice) mais comumente contém nicotina, em concentrações variadas (em regra, 5 a 50 mg por mL), mas essas bugigangas podem ser usadas também para inalar canabinoides, por exemplo.
Apesar de haver distinções, dependendo do contexto, usarei “vape” neste texto exatamente no mesmo sentido de “cigarro eletrônico”, definido acima.
Nos últimos anos, o uso de vapes se intensificou no mundo inteiro, inclusive no Brasil, entre pessoas de todas as faixas etárias, especialmente adolescentes, e de todas as tribos, incluindo não fumantes. Em 2009, a Anvisa proibiu a comercialização de cigarros eletrônicos no Brasil, decisão que foi reafirmada recentemente, em julho de 2022. Apesar disso, é impossível não ver diversos desses dispositivos nas mãos e nas bocas da galera sempre que você sai para tomar uma Coca-Cola Zero à noite.
Quando se trata de saúde baseada em evidências, os vapes têm seu lado (relativamente) bonito, têm seu lado feio, e têm seu lado perigoso. Vamos ver os três.
O lado (relativamente) bonito dos vapes
Antes de mais nada, é preciso ser taxativo: fumar faz mal. Simples assim. Tanto cigarros comuns quanto cigarros eletrônicos são danosos ao organismo. Esquentar coisas e inalar o resultado disso é quase sempre uma má ideia.
Dito isso, o vape parece apresentar algumas vantagens em relação ao cigarro comum.
1. Os vapes não contêm as mesmas substâncias danosas que o cigarro.
Cigarros eletrônicos não “queimam” como os cigarros comuns (não há combustão) e o aerossol que produzem não contém muitas das substâncias danosas que a fumaça do cigarro contém, incluindo alcatrão e monóxido de carbono. Isso não quer dizer que eles sejam inocentes, porém: há várias substâncias potencialmente danosas na “fumaça” do vape.
2. Os vapes contêm menos carcinógenos.
Cigarros eletrônicos contêm várias substâncias carcinogênicas (que aumentam as chances de câncer) que também existem no cigarro comum, mas elas estão presentes em quantidades muito menores. Essas substâncias incluem metais, nitrosaminas e compostos orgânicos voláteis.
3. Os vapes oferecem menos riscos cardiovasculares e menos efeitos na função pulmonar.
Acredita-se (por enquanto) que os cigarros eletrônicos aumentem o risco cardiovascular de quem os fuma, mas de forma menos intensa do que os cigarros comuns. Também parece ser o caso que os vapes afetam muito menos a função pulmonar do que os cigarros comuns, apesar de realmente terem algum efeito deletério nas vias aéreas.
4. Os vapes podem ajudar na cessação do tabagismo.
Evidências limitadas sugerem que os cigarros eletrônicos possam ajudar fumantes a parar com os cigarros comuns, mesmo que parte deles continue fumando vapes. Ainda assim, no momento não se recomenda o uso de vapes com esse intuito, já que as evidencias não são fortes o suficiente para tal recomendação. Além do mais, há a preocupação de que os pacientes deixem de usar ferramentas comprovadamente eficazes na cessação do tabagismo para tentar um método menos seguro e potencialmene menos eficiente (cigarros eletrônicos).
O lado feio dos vapes
Vapes não são flores, apesar do perfume. Seu lado feio, assim como o dos cigarros comuns, é feio de verdade.
1. Os vapes viciam.
A nicotina, a substância presente nos cigarros que causa dependência, também está nos cigarros eletrônicos. Vapes viciam e, considerando que não fumar é melhor do que fumar qualquer coisa, isso não pode ser bom.
2. Os vapes podem ser uma “porta de entrada” para o tabagismo.
Conforme a prevalência do uso de vapes aumenta, cresce a preocupação de que não fumantes se tornem dependentes em nicotina e iniciem o uso de cigarros comuns. Isso é especialmente desassossegador se levarmos em conta a popularidade dos vapes entre adolescentes.
3. Os vapes parecem inocentes.
Cigarros eletrônicos não são fedidos como os cigarros comuns. Não deixam a casa com cheiro de alcatrão, nem a boca, nem as mãos. Pelo contrário, eles são cheirosos e vêm em vários sabores diferentes. A pele de cordeiro esconde quase todo o seu lado feio, como fazia com os cigarros comuns poucas décadas atrás.
4. Os vapes podem causar lesão pulmonar aguda (EVALI).
Até 2020, o CDC (meio que a “Anvisa dos Estados Unidos”) publicou mais de 2800 casos de pacientes internados com uma doença pulmonar aguda causada pelo uso de vapes, incluindo 68 mortes. A maioria dos pacientes usava vapes para inalar canabinoides, mas há relatos de pacientes que savam apenas nicotina. A doença foi associada a algumas substâncias presentes em algumas essências, especialmente acetato de vitamina E.
O lado perigoso dos vapes
1. Os vapes podem nos surpreender (negativamente).
O tabaco e o cigarro existem há séculos, e até 1950 (com o estudo de Wynder e Graham) ainda havia médicos que duvidavam que o tabagismo contribuísse para causar câncer de pulmão. A verdade é que o tabagismo demora algum tempo para mostrar seu lado mais sombrio, e esse também pode ser o caso dos vapes. Nós não podemos dizer ainda quais são todas as suas possíveis consequências na saúde humana. E a surpresa tende a ser desagradável.
2. Os vapes são pouco regulados.
Devido a seu status paralegal, os vapes não passam pelos procedimentos institucionais que garantem sua segurança para os usuários. Há, por exemplo, relatos de queimaduras decorrentes de cigarros eletrônicos que explodem durante o uso ou mesmo enquanto guardados. Vapes fabricados sem seguir regras de segurança podem conter basicamente qualquer coisa, inclusive substâncias extremamente tóxicas.

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